quarta-feira, 22 de julho de 2020

Lenda da Fraga Amarela - Concelho de Torre de Moncorvo

A Lenda da Fraga Amarela

Versão A:
Na Vilariça [concelho de Moncorvo] há uma pedra que servia de grade aos lavradores nos serviços agrícolas, por ser muito jeitosa. Um dia, que a ribeira ia muito grande, a pedra falou a um lavrador e disse-lhe:
– Parte de mim o que quiseres e mete-me no bolso e deita-me à água.
Ele assim fez e imediatamente a pedra se transformou em linda donzela moura sobre uma grade que, água abaixo, ia cantando:

– Adeus Vale da Vilariça,
Adeus Fraga Amarela(63);
Quanto ouro, quanta prata
Não me ficam dentro dela.

Versão B:
No castro de Adeganha há uma imponente fraga, a Fraga Amarela, onde, segundo dizem as gentes da aldeia, habita uma moura, que de vez em quando aparece e se ouve cantar de dentro do penedo.
Ora contam que, certo dia, um lavrador que andava por perto a lavrar um campo, com uma pedra em cima da grade, como é costume nestas terras, para fazer peso e os espigões da grade revolverem melhor os torrões e a terra ficar melhor lavrada, sonhou com a moura. No sonho, a moura dizia-lhe que partisse a pedra da grade, enchesse os bolsos com os bocados assim partidos e deitasse o resto à ribeira da Vilariça.
Quando acordou, o lavrador começou desse modo a fazer. Partiu três ou quatro bocados da pedra da grade, meteu-os nos bolsos do casaco, mas depois arrependeu-se e pensou:
– Que estou eu para aqui a fazer? Tem algum jeito, a encher os bolsos com pedras?...
E deitou todo o resto da pedra da grade à ribeira da Vilariça. Foi então que em cima da Fraga Amarela surgiu a moura encantada a fiar numa roca e a lamentar-se, dizendo:

– Adeus ó Vale do Ouro,
Adeus ó Fraga Amarela!
Tanto ouro, tanta prata
Me ficaram dentro dela!

É que, quando o lavrador meteu as mãos nos bolsos do casaco verificou que os poucos bocados que lá tinha metido eram bocados de ouro. E muito arrependido ficou de não ter partido mais. Mas já nada havia a fazer, que ele tinha atirado com quase toda a pedra da grade à ribeira da Vilariça. Nem ele pôde obter mais ouro, nem o encanto da moura se desfez. Perdera e ela lá continua encantada na Fraga Amarela, aparecendo e fazendo-se ouvir de vez em quando.

(63) Trata-se de uma fraga muito útil para o povo, pois funciona como relógio de sol. É meio dia quando o sol a cobre em toda a sua dimensão.

Versão C (A Lenda da Pedra Encantada):
Conta a gente desta terra que, há muitos anos passados, quando toda a gente era humilde e dava as mãos ao trabalho, todos os camponeses se dirigiam para o campo, para cultivar os seus terrenos. Uns plantavam batatas e feijão, outros lançavam as sementes à terra, para depois colher o centeio e o trigo.
Certo é que todos precisavam de agradar as terras e, para a grada ficar mais pesada, todos eles escolhiam uma pedra muito lisa e redondinha que, por magia ou coincidência, estava sempre ali à mão. Tudo isto se repetiu por muitos anos, até que um dia um moço sonhou com a pedra, isto é, sonhou que ela falava e lhe pedia que a ajudasse a voltar para a sua casa.
Sonhou uma vez, sonhou duas e à terceira, sempre com o mesmo sonho, dirigiu-se ao campo, agarrou a pedra e dirigiu-se com ela até junto do rio Sabor. Aí partiu-lhe os quatro cantos, que era o que no sonho lhe fora pedido, depois atirou-a ao rio.
Então, qual não foi os eu espanto ao ver que a pedra se transformou numa linda sereia que, seguia rio abaixo, nadando e cantando assim, com uma voz encantadora:

– Adeus Vale da Vilariça,
Adeus ó Fraga Amarela,
Tanto ouro, tanta prata,
Ali fica dentro dela.
Nestes montes eu vivi
- Como pedra encantada,
Tantos anos adormecida
E pela grade embalada!.

Versão D (Lenda dos Barrais da Vilariça):
Havia no Vale da Vilariça uma enorme pedra, que era usada por todos os lavradores para colocar em cima da grade quando andavam a agradar os terrenos para plantarem depois os melões.
Essa pedra passava de parcela em parcela e com os anos foi-se gastando. Um dia, em que dois lavradores andavam desavindos, um deles, ao acabar de gradar a sua terra, decidiu não passar a pedra para o seu vizinho e, em vez disso, deitou-a para a ribeira, que passava perto.
Nesse instante, formou-se uma trovoada enorme e a água passou a correr e a transbordar em todos os regatos. E, de repente, no cimo da corrente da ribeira turva, formou-se uma linda donzela que, enquanto seguia ribeira abaixo, cantava:

– Adeus, barrais da Vilariça,
Adeus ó Fraga Amarela,
Tanto ouro e tanta prata,
Que me ficam dentro dela!

Esta fraga é um grande penedo que se distingue dos outros pelo tamanho e pela cor amarelada. Diziam os mais antigos que nela se encontra um tesouro com muito ouro. Quanto a mim, o ouro que há está no terreno fértil do vale. O que é preciso é trabalhar nele e saber cultivá-lo.

Fonte – versão A: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 155. Fonte – versão B: PIGNATELLI, Inácio N. –
“Histórias do Douro”, in Jornal de Notícias, Porto, 20-7-1997.
Fonte – versão C: Inf.: Rosa Abade, 38 anos; rec.: Junqueira, T. de Moncorvo, 2001. 
Fonte – versão D: Inf.: Laurentina Carneiro, 74 anos; rec.: Horta da Vilariça, T. de Moncorvo, 2003.

in:Mouros Míticos em Trás-os-Montes – contributos para um estudo dos mouros no imaginário rural a partir de textos da literatura popular de tradição oral.

Alexandre Parafita

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