terça-feira, 20 de junho de 2017

Directamente da teta da Vaca

Olá familiazinha. Decorreram mais um ano as trezenas de Santo António, em Bragança, na igreja de Santa Clara, onde é tradição no dia 12, à noite, no fim da trezena ser distribuído um pão biju por pessoa . Quando eu era criança apercebia-me que as famílias numerosas e pobres da cidade marcavam a sua presença levando assim alimento para a família. Hoje em dia há pessoas que guardam o pão de um ano para o outro, para que nunca falte o pão em casa e com a particularidade deste não criar bolor. Há muitas igrejas no nosso distrito que têm a imagem de Santo António. Algumas localidades têm casa própria (capela) do Santo. Em Bragança, no centro da cidade, no início do antigo Toural, há uma capela particular, da família Carmona que abre as suas portas única e simplesmente no dia de Santo António para a celebração da santa eucaristia.
Na semana passada celebrámos a vida ao tio Amadeu Rocha, de Salsas, 82 anos, ao tio Luís Portela, 73, tia Maria da Glória, de Vilar Seco, Vimioso, 58, e a srª minha mãe,  tia Aninhas Sernadela, que fez as 3 machadinhas, 77, no dia 7. O tio Rocha Lopes festejou a bonita idade de três vezes 23. A nossa Ministra dos aniversários, a Tia Silvina, de Vila Seca, completou 55 anos e o nosso tio dos primórdios, Delmino Vaz, de Grijó (Bragança), entrou na gente grande, 65 anos.

Hoje apresento-vos a tia Chica Leiteira, de Rebordãos, uma profissão já extinta.

Francisca Aurélia Afonso, mais conhecida como tia Chica Leiteira, nasceu a 26 de Dezembro de 1928 e é a 5ª de 13 irmãos, casou aos 24 anos de idade e teve um casal de filhos.
Porque queria formar os filhos, uma vez que os professores lhe diziam que tinham capacidades, a tia Francisca, por influência de uma amiga que já tinha a profissão de leiteira, decidiu fazer o mesmo, uma vez que a amiga lhe dizia que ganhava bem. No leite que compravam aos vizinhos, ganhavam 5 tostões em litro e, se comprassem em média 80 litros por dia, ao Domingo tinham os mesmos litros grátis, porque a distribuição era diária.
O dia começava por volta das 6h da manhã. Os produtores, donos das vacas (as turinas), levavam o leite a todas as leiteiras e às 07H00 lá ia a tia Francisca com a sua burrita, fazendo o transporte de 100 litros, aproximadamente, até Bragança, durante 9 anos. Como os fregueses iam sempre aumentando e a burrita já ia ficando velhota, a tia Francisca foi obrigada a comprar uma mota com atrelado, conseguindo assim transportar 200 litros diários, usando bilhas e os cântaros. O leite era pesado no lactário, nas instalações da câmara municipal. O pesador (funcionário da câmara) analisava o leite e mudava-o para cântaros do lactário e lacrava-os.
Passados alguns anos, as leiteiras foram multadas por venderem o leite mais caro do que a Suil (empresa que fazia o engarrafamento do leite). Elas compravam-no a três escudos e cinquenta centavos e a Suil queria que o vendessem a três escudos, mas elas vendiam-no a cinco.
Dessa multa resultou uma pena suspensa de dois anos, e como estava a meio da formação dos filhos, teve que trabalhar os dois anos para a Suil. Findo esse período, voltou tudo à normalidade.
Ainda me estou a lembrar da Tia Chica Leiteira com a sua bata branca e um cântaro na mão e outro no regaço, todos os dias pelas 09h00 na rua Nova, nº 93, onde eu me criei.
Esperava esse momento com grande satisfação, para de seguida ferver o leite e poder comer a nata que se formava com açúcar.
Cada vez que me lembro que o leite saia da teta da vaca às 6 da manhã e eu, e muitos, às 9 já o estávamos a beber...
Como era uma pessoa muito típica e popular, teve muitos fregueses, desde particulares a instituições.
Bem haja Tia Francisca, pois o seu leite ajudou-me a crescer.
Foi leiteira durante catorze anos, conseguindo assim educar os seus filhos, formando a filha enfermeira e o filho professor, de quem tem muito orgulho.
De salientar que na aldeia de Nogueira há um painel de azulejos, no lavadouro público, que homenageia as leiteiras de Bragança.

Tio João
in:jornalnordeste.com

1 comentário:

  1. Por muitos anos foi a minha madrinha, a quem sempre lhe chamei de avó, que distribuiu o Pão de Santo António.

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