sexta-feira, 23 de junho de 2017

Município de Bragança quer colocar o concelho na rota do turismo sefardita

A câmara está empenhada em fazer de Bragança um novo pólo de preservação da memória e herança da cultura sefardita relacionada com o Nordeste Transmontano.
O atual executivo quer ainda aproveitar esta aposta para captar turistas, estudiosos e interessados por estas matérias, 230 dos quais participaram no congresso internacional realizado no âmbito de Terra (s) de Sefarad-Encontros de Culturas Judaico-Sefarditas, que
decorreu, no Teatro Municipal, entre 15 a 18 de junho. O município investiu 1,7 milhões de euros na dotação da cidade de equipamentos culturais, como o Centro de Interpretação da Cultura Sefardita e o Memorial e Centro de Documentação, o último inaugurado na passada sexta-feira, mas também na realização dos Encontros.
O edifício do Memorial implicou um investimento de cerca de 386 mil euros, cofinanciado pelo Programa EEA-Grans da Embaixada na Noruega e que, segundo o presidente da câmara, Hernâni Dias, “dá um contributo maior da memória da presença sefardita em Bragança, que retrata a comunidade local, através de uma componente imaterial destinada, sobretudo à investigação”. O equipamento está dotado de uma pequena sinagoga, preparada para receber actos religiosos.
O autarca adiantou que o concelho pode reganhar um “papel importantíssimo” na rota da cultura judaica a nível internacional e “assumir-se como um grande centro da memória sefardita, pois, provavelmente não há nenhum município que tenha o investimento como tem Bragança relacionado com a temática”, sublinhou.
Além da atração de turistas à região, na semana passada a cidade foi visitada por 50 israelitas, a câmara tem na mira a captação de investimento de judeus espalhados por todo o mundo, e que têm raízes no concelho.
Paulo Mendes Pinto, coordenador da comissão executiva do congresso, considera que “é um evento de coragem” a organização da iniciativa. Pois “apesar de ser óbvio quando se olha para a historiografia a importância desse passado, a importância real não corresponde
ao lugar que lhe damos”, afirmou. Nas aulas de história fala-se pouco deste assunto.
“Durante séculos foi obliterado da nossa memória. Por isso mesmo nos tempos que correm e num estado laico, ir ao encontro desta temática é um acto de coragem”, acrescentou o investigador.
Em Portugal existe apenas uma universidade que se dedica aos estudos sefarditas, a Faculdade de Letras. “Os eventos resumem-se a algumas conferências, alguns debates importantes, mas um congresso como este, integrado numa jornadas culturais, que ocupa quase uma semana, é a primeira vez que se faz em Portugal, sobretudo com esta dimensão”, destacou Paulo Mendes Pinto.

“Trás-os-Montes não era periferia era centro”

A Rede de Judiarias de Portugal, criada há cerca de seis anos, congrega 40 municípios,
dos quais 12 inauguraram espaços dedicados à memória sefardita. “Por causa do turismo, que está a crescer, pelo lado cívico, a noção de que há a memória, e por perceberem que há 300 anos toda a zona de Trás-os-Montes não era nem em termos de desertificação, nem em termos de economia, o que nós temos como estereótipos. Existiam aqui inúmeros empreendedores, havia inovação e existiam centros culturais”, destacou.
O objetivo do congresso prendeu-se com a necessidade de perceber melhor o contexto desta temática e dar conta que os investigadores serão “grandes difusores e promotores desta mensagem e do turismo em Bragança” pois são de países muito diferentes.
Estima-se que existam mais de 14 milhões de judeus em todo o mundo, a maioria vivem em Israel e nos Estados Unidos da América. “Vieram muito bons investigadores, de várias partes do mundo, que trazem muitos esclarecimentos aos que se interessam por esta temática. A nossa ideia é fazer um evento de referência onde a investigação e a tradição estivessem aliados”, referiu o autarca, que se confessou agradado “por ver na plateia pessoas que não são investigadores mas quiseram vir assistir e beber o conhecimento dos especialistas”, acrescentou.

Comunidade Sefardita de Jerusalém homenageou Bragança

A cidade de Bragança recebeu uma medalha de reconhecimento atribuída pelo Conselho da Comunidade Sefardita de Jerusalém, a mais antiga desta cidade, pelo trabalho realizado a favor da preservação e da história da cultura deste povo.
O autarca disse que a distinção “é uma honra”, sendo ainda mais importante “por reconhecer o que se faz na preservação da história da cultura sefardita”.
Tudo isto, dá alento ao município para continuar a trabalhar a temática, a nível de recursos humanos e financeiros.
A medalha, que simboliza quatro sinagogas sefarditas que estão abertas na cidade velha de Jerusalém, construídas entre o século XVI e XVIII, foi entregue por Abraham Haim, um dos oradores no congresso, por causa do passado histórico da cidade de Bragança e por esta ter decidido “recuperar vários caminhos e formas o legado judicio, antes da expulsão dos judeus e posteriormente, com os cristãos-novos”.

Uma cultura com passado

A recuperação da memória da cultura judaico-sefardita não aparece em Bragança por acaso.
O concelho após o século XV foi um importante centro económico e cultural da comunidade judaica, uma vez que aquando da expulsão dos Judeus de Castela e Aragão em 1492, Bragança desempenhou um papel importante no seu acolhimento, por se localizar aqui uma das cinco fronteiras definidas por D. João II para a recepção dos refugiados.
As comunidades judaicas aqui radicadas dinamizaram o crescimento económico, sendo notório todo o trabalho na indústria da seda, trabalho de curtumes e diversos atividades artesanais.
A cidade foi durante séculos um dos esteios nacionais da realidade de cripto-judaismo.

No século XX, foi recriada a comunidade, tendo por base cripto-judeus.

Glória Lopes
in:mdb.pt

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