segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Dizeres e Ditos na Carta Gastronómica de Bragança

Horácio do Nascimento Esteves
Sr. Horácio do Nascimento Esteves87 anos, vive em Carragosa.
Começou a trabalhar na agricultura. Aos 15 anos trabalhou na floresta, ganhava cinco coroas por dia, tinha de as dar ao Pai e à Mãe. O horário era de sol a sol. Se chegasse atrasado só ganhava três quartos da jorna. Também trabalhou nas estradas.
Por fim arranjou uma junta de vacas e ficou agricultor para sempre. Cultivava batatas, centeio e trigo. O centeio comia-se dia a dia, o trigo nos dias de festa, nestes dias melhorava-se a comida, faziam canja, torravam-se galinhas na brasa e matava-se um carneiro, vitela os agricultores não a viam. O toucinho comia-se todos os dias, o de dantes era melhor do que o de agora.
O azeite não era muito, punha-se o dedo na ponta do azeiteiro para que não caísse em quantidade. Não se matavam cabritos, nem cordeiros, vendiam-se e rendiam bom dinheiro. Comiam carneiro. Eram sete irmãos, comiam todos do mesmo prato, muitas vezes o Pai e a Mãe não comiam para dar aos filhos. Não havia bifes. De manhã comiam pão untado com azeite e alho. Andaria na quarta classe quando conheceu a manteiga, a Cáritas é que trouxe às aldeias a fama da manteiga e do queijo, que era rectangular, cortavam-no às fatias, os ricos ficavam com ele.
O Verão era custoso, mas havia alegria, mesmo com fome andavam contentes e respeitavam uns e outros. Respeitava-se os Pais, os Avós, o Padre e a Senhora Professora.
O que o Pai mandasse era o que tinha de se fazer. No casamento só foram os padrinhos e o padre. Lembra-se de terem comido cabrito assado com batatas.
Vendiam vinho e castanhas. Arrancaram as vinhas, recebeu dinheiro para isso, agora tem oliveiras.
Está muita gente a voltar à aldeia porque na cidade não se governava. O agricultor descansa mais no Inverno, mas há sempre que fazer. Ele ainda se levanta às seis da manhã, cultiva batatas, cebolas, feijões e tomates.


Idalina da Conceição da Fonte
Sr.ª Dona Idalina da Conceição da Fonte, 89 anos, vive em Bragança.
Viviam mal por falta de orientação paterna. Não frequentou a Escola.
Fazia manteiga do leite das vacas do patrão, uma semana para ele, outra semana para ela.
Na matança faziam caldo, bom arroz de couve, carne cozida, feijões e fígado. Não se lembra de fazer folar, bolos económicos sim.
O peixe mais consumido era o capatão e os peixes apanhados pelos irmãos.
Habitualmente cozinhava arroz de bacalhau e batatas com bacalhau. Se ao almoço tivesse dificuldades no arranjar de comer, cozinhava batatas com chouriço.
Os chouriços conservam-nos em banha metidos numa panela. Nasceu em S. Pedro dos Serracenos.


Ilda da Conceição Gonçalves
Sr.ª Dona Ilda da Conceição Gonçalves87 anos, vive em Vila Nova.
Nunca foi à Escola. Ficou sozinha muito nova, aos quatro anos. Foi paqueta desde pequenina. Andava de um lado para o outro.
Casou em Vila Nova, ela e o marido muito pobres, cada um a servir em cada casa.
Pagaram o vinho, comeram meio cordeiro e moletes de trigo. Foi a boda.
No Carnaval as mulheres vestiam-se de homens, os homens de mulheres, e sujavam as pessoas atirando-lhe farinha de lentilhas.
No Entrudo comia-se butelo e chouriço verde, na Páscoa folar e carne guisada.
As ovelhas velhas não se comiam, carneiro só para criação.
As pessoas doentes comiam caldinhos, um arrozinho ou puré, as crianças sopas de leite. Mamavam durante um ano.


Ilda de Jesus Pereira
Sr.ª Dona Ilda de Jesus Pereira, 80 anos, Vive em Izeda. Comíamos o que a terra dava. Um comer de couves de penca, batatas e azeitonas, já era muito. Faziam caldo de lentilhas, tentavam ver quem conseguia apanhar mais com a língua. Andava no rebusco da azeitona. Não havia comidas fidalgas. Em Izeda sempre houve azeite. A erva ossinha usava-se para fazer a calda das azeitonas. No mês de Maio não se podia mexer nas azeitonas com a mão, nem as mulheres com a menstruação as podiam cortar. Tirava-se da calda com uma escumadeira.
Também faziam bolas de unto as quais se conservavam pelo ano fora, para se fazer a sopa de couve-galega no Verão, e tronchuda no Inverno. Rabas só se comiam no Natal, vinham da serra a troco de azeite.
A hortelã só se usava para fazer chás contra as dores de barriga. Nos Santos quem podia
comprava marrã, depois comia-se assada na brasa. Os figos punham-se na lareira e ficavam como assados.
O seu casamento foi muito pobre. A minha mãe não o fez, realizou-se em casa do meu irmão, na véspera uma vitela de um vizinho partiu uma perna, e então comprámos uma arroba para assar. Cozeu uma fornada de pão de trigo e comprou vinho porque tinha
conseguido guardar 100$00. Também comemos arroz de frango e económicos.
Teve seis filhos.

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